A Redescoberta do Trauma: Quando o Passado Não Passa
- CAMILA AMARAL

- 9 de jun.
- 3 min de leitura
Por que algumas dores parecem se repetir, mesmo depois de anos? O que faz com que certas pessoas permaneçam presas a um passado que já passou, mas nunca foi embora?
Este texto é um convite para compreendermos o trauma como muito mais do que uma lembrança difícil — mas como uma experiência que se imprime no corpo, reorganiza o cérebro e transforma radicalmente a forma de estar no mundo.
Trauma não é apenas memória. É aprisionamento.
Algumas experiências são tão devastadoras que não conseguimos simplesmente “superá-las”. Para muitos sobreviventes, especialmente veteranos de guerra, sobreviventes de abuso ou violência, o trauma não vive apenas na mente — ele habita o corpo, molda a percepção e aprisiona a espontaneidade.
O psiquiatra Abram Kardiner, ainda nos anos 1940, já reconhecia isso. Observando soldados traumatizados, descreveu o que hoje chamamos de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) como uma “fisioneurose”: uma perturbação não apenas psíquica, mas corporal.
“Nem todo trauma está na cabeça. Ele está no corpo. Ele vive nos reflexos, na musculatura, na pele, na respiração, nos batimentos.”

A vergonha silenciosa que nos faz adoecer
Para quem passou por experiências traumáticas, muitas vezes a dor mais insuportável não é o que aconteceu, mas a forma como isso reverberou dentro de si. O trauma frequentemente gera vergonha — de ter sentido medo, de não ter reagido, de ter se calado, de ter sobrevivido.
Essa vergonha é ainda mais cruel quando o trauma envolve relações próximas, como em casos de abuso infantil. A criança, para sobreviver, muitas vezes precisa manter vínculos com quem a feriu, o que confunde sua percepção de amor, cuidado, dor e terror.
“Será que eu consenti? Será que eu fiz algo para merecer?” Essas perguntas, que ecoam em muitas vítimas, não falam da verdade dos fatos, mas da distorção emocional que o trauma impõe.
Por que é tão difícil falar sobre o trauma?
É doloroso assistir à dor dos outros — e ainda mais doloroso reviver a própria. Por isso, muitas pessoas fogem das lembranças com álcool, drogas, compulsões ou dissociação. O trauma, mesmo quando parece distante no tempo, continua a ser vivido no presente — de forma invisível, mas real.
O mundo visto pelos olhos de quem foi ferido
Um dos aspectos mais profundos do trauma é que ele altera a percepção.O mundo deixa de ser seguro.Uma pessoa comum na rua pode parecer uma ameaça.Um professor rígido pode despertar pânico.Uma festa pode soar como um campo de batalha.
Em testes como o Rorschach, que mostram apenas manchas de tinta, percebemos isso com clareza: pessoas traumatizadas tendem a projetar significados ameaçadores ou confusos, mesmo em estímulos neutros. É como se seu sistema interno estivesse sempre em alerta — vendo perigo onde há apenas vida.
O trauma como prisão — e também como sentido
Muitas pessoas vivem décadas presas ao passado, não por escolha, mas porque esse passado foi a última coisa que realmente as fez sentir algo.
“Só me sinto vivo quando revivo o trauma.”Essa frase, dita por veteranos de guerra, ecoa também em muitas outras vítimas de violência e abandono.
O trauma rouba o presente, mas dá uma ilusão de sentido. É como um campo de gravidade que mantém a pessoa girando ao redor da dor original, sem conseguir se libertar.
Existe saída?
Sim, existe. E ela começa com um olhar que reconhece que:
O trauma não é frescura, nem fraqueza.
Ele não é apenas psicológico, mas também neurológico e somático.
Ele pode ser cuidado, com apoio certo, tempo, presença e corpo.
Curar o trauma é reconstruir a confiança no mundo e em si mesmo. É entender que o passado doeu, mas que é possível viver no presente com integridade e liberdade.
Se você se reconhece em alguma parte deste texto...
...saiba que não está sozinha/o. A dor que você sente tem nome, tem causa — e pode ser acolhida com respeito e cuidado.
✨ A psicoterapia informada pelo trauma oferece caminhos seguros e respeitosos para esse reencontro com a vida.
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